Monday, March 26, 2012

A Escória da Sociedade

Houve grande alarido nos comentários a notícias quando se soube que o autor dos atentados de Toulouse era um auto-declarado membro da Al-Qaeda e não um nazi. Houve grande alarido e essencialmente esse alarido era de indivíduos que quase exigiam um pedido de desculpas pela confusão e se queixavam de uma injusta perseguição.

Ora, como sabemos, esses indivíduos estão longe de ser inocentes e longe de terem as mãos limpas. Ainda não há muito tempo os vimos a condenar um acto bárbaro, atirando-o a terroristas islâmicos, para rapidamente virarem o discurso e elogiarem o seu correlegionário norueguês.

O La Stampa publicou a 22 de Março aquele que me parece ser um dos mais importantes textos sobre este assunto e eu transcrevo-o na íntegra, de acordo com a versão traduzida para português no Europress.


Neonazis e terroristas islâmicos, os nossos pesadelos geminados


Os primeiros suspeitos pelos assassínios de Toulouse e de Montauban foram três antigos paraquedistas neonazis. O massacre de Utoya começou por ser atribuído ao terrorismo islâmico. São dois rostos opostos da intolerância ao multiculturalismo que se confundem com frequência.


Afinal, foi um fanático de Alá que emergiu do inferno de Toulouse. Não foi um paraquedista neonazi que andou a ruminar nas entranhas obscuras da história de França, mas um soldado dessa intifada que é incubada quotidianamente nos subúrbios franceses.

Uma guerrilha surda que ganha dimensão, de Toulouse a Paris, nesses "territórios perdidos da República", como os batizou um famoso panfleto de denúncia do antissemitismo vulgar que reina nas escolas suburbanas.

É este mal obscuro, particularmente tenaz em França, que liga as duas pistas exploradas pelos investigadores e a opinião pública, nos dias manchados pela loucura assassina: três jovens militares (de origem norte-africana) mortos a sangue-frio, outro gravemente ferido, e mais quatro pessoas (três crianças e um homem) perseguidas e abatidas como animais, no colégio judaico Ozar-Hatorah de Toulouse, a “cidade rosa” que alberga o túmulo de São Tomás, o mais ponderado dos filósofos cristãos.

Um outro culpado
Pensou-se inicialmente que o assassino seria um dos três paraquedistas expulsos do 17º regimento de Montauban devido às suas simpatias neonazis. Os jornais publicaram uma fotografia dos três homens a fazer a saudação hitleriana, envoltos numa bandeira com a cruz suástica.

Jovens fanáticos, franceses, brancos. Tinham a biografia típica do assassino, aquele que se vinga dos irmãos de armas que o denunciaram, e abate três soldados de origem magrebina, antes de perseguir os judeus numa escola. O protótipo do ativista do partido de Le Pen – o que não significa que todos os eleitores dos Le Pen, Jean-Marie e a filha Marine [candidata da extrema-direita à presidência francesa], sejam assassinos em potência.

A realidade acabou por apontar outro culpado, Mohamed Merah, francês de origem argelina ("imigrante de segunda geração", segundo a nomenclatura em uso), que, há uma da manhã de ontem, telefonou para o canal de televisão France 24, a revelar as razões para tal atrocidade à jornalista de serviço, Ebba Kalondo – uma mulher de ascendência africana (estamos numa sociedade multiétnica) de voz doce e tranquila.

Mohamed Merah disse ser filiado da Al-Qaeda e pretender "vingar os nossos irmãos e irmãs da Palestina", denunciando a lei que proíbe o véu integral para as muçulmanas, bem como a participação do exército francês na guerra do Afeganistão.

Como é possível dois cenários tão diferentes, se não mesmo opostos, poderem ter sido encarados para explicar estes massacres? A resposta é que ambos eram igualmente plausíveis. Tanto o terrorista islâmico como o paraquedista neonazi pertencem à escória da sociedade, são dois pesadelos opostos e que, no entanto, coabitam e não se neutralizam um ao outro, antes se reforçam mutuamente.

O mesmo curto-circuito que em Oslo
O mesmo curto-circuito lógico produzido em Toulouse havia já acontecido em julho passado, em Oslo, após o massacre perpetrado pelo fanático Anders Behring Breivik: oito mortos na explosão de uma bomba e 69 mortos a tiro num acampamento de jovens sociais-democratas.

A primeira hipótese foi a de um ato perpetrado por terroristas islâmicos contra jovens ocidentais. Ora o culpado era um norueguês loiro de trinta anos, que se autointitulava fundamentalista cristão e pró-israelita, hostil ao multiculturalismo e ao islamismo. Quis atingir os jovens socialistas, que considerava responsáveis por uma imigração muçulmana maciça.

Dois pesadelos diferentes, portanto, mas complementares e compatíveis, ao ponto de os políticos terem suspendido durante algumas horas uma campanha presidencial especialmente acirrada. Por respeito pelas vítimas, evidentemente, seguindo as normas de vida que, em França, são ensinadas na escola.

Mas também para dar tempo para se entender, para evitar cometer erros. O tom é firme, [o Presidente Nicolas] Sarkozy fez do tema da imigração e dos estrangeiros o seu cavalo de batalha no combate a Marine Le Pen, ao ponto de o Wall Street Journal o apelidar "Nicolas Le Pen".

O Presidente promete aos franceses uma França mais forte e mais fechada. Não descartou a suspensão do Tratado de Schengen, de livre circulação de pessoas entre países da UE. Uma perspetiva que deixou Angela Merkel bastante indisposta, tirando-lhe a vontade anunciada de participar nos comícios eleitorais de "Sarko”.

É este o clima que prevalece hoje nessa França onde Mohamed Merah, célula adormecida e solitária da Al-Qaeda a viver há vários anos no bairro do Mirail, em Toulouse, decidiu passar à ação. Podia ter sido um paraquedista neonazi. Mas acabou sendo o fantasma de Bin Laden. O que não tranquiliza ninguém.

Thursday, March 22, 2012

A História repete-se...

 Não sei o que passa pela cabeça de um polícia que vê numa câmara fotográfica uma profunda ofensa a qualquer coisa e que o leva a agredir, porque não tem outro nome, o portador dessa câmara. Lembro-me de em 1994 o ter visto na Marinha Grande. Nunca esperei voltar a vê-lo na minha vida. 

 Na foto, Patrícia Moreira, fotojornalista da AFP. Ela é apenas um sinal de que não somos a Grécia. Aqui há uma máquina afinada que faz tudo parecer bem, que faz tudo parecer normal, que nos diz que não estamos a sofrer.