Wednesday, January 23, 2013

Citações - Os nossos banqueiros são de confiança?, por Nicolau Santos

Hoje transcrevo o artigo de Nicolau Santos no site do Expresso de 21 de Janeiro.


Os nossos banqueiros são de confiança?
Nicolau Santos
17:24 Segunda feira, 21 de janeiro de 2013

O título é provocatório, mas tem a ver com o facto de ter sido dito e redito que a banca portuguesa não só está sólida como nada tem a ver com o que se passa noutros países, onde os escândalos se sucedem com regularidade.
Quanto à solidez, estamos conversados. Três bancos portugueses recorreram já a ajudas estatais (BCP - 2000 milhões, BPI - 1500 milhões, Banif - 1100 milhões), sem as quais não conseguiriam cumprir os rácios exigidos pela EBA, Associação Bancária Europeia.
Quanto aos escândalos, façamos um esforço de memória. Em 2003, Tavares Moreira, presidente não executivo do CBI, é suspenso pelo Banco de Portugal de exercer funções em conselhos de administração de empresas financeiras sob a acusação de declarações falsas, manipulação e falsificação de contas (em 2006, o Ministério Público arquivou o processo).
João Rendeiro, ex-presidente do BPP, que em dezembro de 2008 pediu uma ajuda estatal de 750 milhões para salvar o banco, é acusado pela CMVM de criação de títulos fictícios, violação de deveres relativos à qualidade de informação prestada aos clientes, entre outras irregularidades graves e muito graves.
José Oliveira e Costa, ex-presidente do BPN, foi detido no final de 2008. Há dois anos que está a ser julgado por sete crimes, devido a ter criado uma contabilidade paralela num banco virtual. A fatura para os contribuintes ronda neste momento os 6000 milhões de euros.
Jorge Jardim Gonçalves, presidente do BCP, acaba de ser condenado a pagar uma coima de um milhão de euros pelo crime de manipulação de mercado, mediante a criação de offshores e falsificação de documentos. Com ele, foram condenados Filipe Pinhal, Christopher de Beck, António Rodrigues, Paulo Teixeira Pinto e Alípio Dias. Todos vão recorrer das sentenças.
O atual presidente do Banif, Jorge Tomé, é arguido num processo relativo à altura em que exerceu funções como administrador da Caixa Geral de Depósitos.
Mais recentemente o presidente do BESI, José Maria Ricciardi, e o administrador do BES, Amílcar Pires, foram constituídos arguidos na sequência de uma queixa da CMVM envolvendo a transação de ações da EDP e um alegado crime de abuso de informação privilegiada.
Finalmente, o presidente do BES, Ricardo Salgado, apressou-se a pagar os impostos devidos por dinheiro que tinha colocado no exterior sem ter sido declarado ao fisco.
Várias destas situações podem redundar em nada e alguns destes responsáveis estarem inocentes. Mas convenhamos que é preocupante o número de banqueiros portugueses que neste momento estão a contas com a justiça.
E a não ser que se considere que o Banco de Portugal e a CMVM estão contra a estabilidade do mercado, talvez seja melhor os banqueiros meterem a mão na consciência e reforçarem os seus códigos de comportamentos.
O bem mais precioso que um banco tem é a confiança dos seus clientes. Quando ela se perde, o banco está perdido. Mas a confiança nos bancos é a confiança naqueles que os dirigem. É bom que os banqueiros nacionais meditem nisso.

Tuesday, January 15, 2013

Quero, tipo, sei lá, cenas!

 O estado de espírito que se vive em Portugal ficou bem patente com outro acontecimento da semana passada. Uma marca tecnológica convida vários bloggers ligados ao mundo da moda e uma delas manifesta que entre os seus desejos se encontra uma mala da Channel. O que pareceu afectar a maior parte das pessoas pela sua futilidade e pelo preço da mesma (parece que aquilo é brinquedo para custar mais do que muitas famílias ganham por mês). Face ao sururu que gerou, a marca tecnológica correu a tirar o vídeo da net. Face a esta atitude fico a pensar que a Pêpa é uma figura de relevo na sociedade em geral, que apregoa o desapego de bens materiais e apologista ferrenha da austeridade como forma de libertação. Em suma, esta blogger de moda é mais franciscana que S. Francisco de Assis e cometeu a heresia de desejar uma mala bem cara.

 Este episódio não mereceria muitos comentários não se desse o caso de revelar uma certa tacanhez endógena. O facto de estarmos num momento dramático não impede, ou não deveria impedir, as pessoas de terem sonhos. Quando as pessoas manifestam esses desejos em termos de "gostava de comprar com o meu dinheiro" ou "seria bom conseguir juntar para comprar" acho que ainda menos há para condenar. No fundo, isto é o que a pessoa em causa disse. Só que a reacção generalizada traduz aquele espírito bem entranhado entre nós que não devemos ter ambição e devemos conformarmo-nos com as migalhas que nos vão atirando. Esse era o paradigma da educação salazarista, esse é o desejo e a vontade do actual (des)governo, esse é o pensamento de quantas e quantas alminhas por esse Portugal fora suspiram por outros tempos. Esse é o pensamento de quantos condenam os Mourinhos e os Ronaldos e vibram com as suas derrotas como se fossem vitórias pessoais. A verdadeira vitória do salazarismo está à vista. Passado tanto tempo num regime de liberdade de opinião ainda é senso comum em Portugal que a falta de ambição é virtuosa. Venderam-nos que a austeridade liberta, bem ao género Spärlichkeit macht frei e entretidos que estamos nisso condenamos os que se recusam a aceitar a miséria. 

 A título pessoal gostava de poupar para comprar um carro eléctrico, daqueles urbanos pequeninos que não têm problemas de estacionamento e em alguns parques até têm lugares especiais. Também gostava de fazer uma viagem de comboio pelos países Nórdicos. Gostava de conseguir ir a Copenhaga revisitar o Louisiana. Gostava de ir à Austrália. Gostava de comprar um computador novo, uma televisão com leitor de blu-ray e uma consola para jogar. E gostava de fazer tudo isso com o meu dinheiro (e que como a muitos outros portugueses me custa a ganhar). Gostava, e seria bom que o conseguisse fazer e não falto ao respeito a ninguém, nem demonstro menos solidariedade por o manifestar. Manifestar que gostava de o fazer não quer dizer que o faça. Enquanto que realisticamente espero de facto revisitar o Louisiana e talvez comprar um dos equipamentos de lazer, todos os outros desejos deverão ficar pelo caminho, porque tenho uma renda para pagar, preciso de comer e tenho despesas várias com transportes. Cumpridas todas estas necessidades, porque não posso decidir o que fazer com o meu dinheiro? Os bancos já se viu que o vão usar para apostas pouco claras em que o derrotado sou sempre eu (porque perco o meu dinheiro e depois levam-me os impostos), portanto bem posso usá-lo no imediato!

 Ter objectivos ajuda-nos a olhar para o amanhã de outra forma. Dá-nos vontade, ajuda-nos a encontrar motivação naquilo que fazemos. Ter objectivos dá-nos força para lutar contra marés para os obter. É verdade que para muitos o objectivo é chegar a amanhã com comida, casa e saúde. Felizmente a Pepa está para lá dessas necessidades. Ainda bem para ela. Eu também quero futilidades e não as confundo com necessidades!

PS - O título desta opinião foi inspirado entre os tiques dos vários bloggers convidados pela tecnológica (e a menina que quer ir a Tóquio apenas tinha a ganhar em frequentar as mesmas aulas de dicção do Jorge Jesus) e o clip dos Gato Fedorento que segue abaixo.

Monday, January 14, 2013

Bem pregam todos na estalagem, fazei o que eles mandam e não o que eles fazem.

 A segunda semana de 2013 foi uma semana pródiga em acontecimentos de alguma relevância, com a revelação, no dia 8, da lista de reformados em Fevereiro da Caixa Geral de Aposentações. Desta lista foi dado particular destaque à autarca pelo PCP que lidera a Câmara de Palmela. Pouco ou nenhum comentador aproveitou a notícia paralela (e sem chamadas à página de entrada) em que se menciona que o Presidente da Câmara de Loulé beneficiaria da mesma situação. A mesma, apesar de na notícia da autarca de Palmela se esquecerem de mencionar que até ao final do mandato, tal como o seu colega, apenas auferirá do salário de autarca.

 O primeiro comentário que merece ser feito é: porque é que cada uma das pessoas (quem) foi colocada em notícias separadas quando se trata da mesma situação (o quê), na mesma altura (quando), da mesma forma (como)? Ficou a faltar o "porquê", mas claramente a resposta é porque a lei permite. Posso ser um opositor da austeridade económica que neste momento amarra o país, mas o despesismo nas palavras que a imprensa em geral recorre para tratar estes dois autarcas é claramente injustificado. Ou será?

 O PCP, partido da autarca de Palmela, quando confrontado com a situação emitiu uma nota onde não explica nada nem nada justifica. Apenas aproveita para remeter para uma decisão pessoal da visada. O PSD, partido do autarca de Loulé, não emitiu qualquer nota, e questiono-me até se terá sido questionado, ou se a notícia do seu autarca também andou a ser partilhada em fúria pelas redes sociais (na altura em que escrevo o número de comentários é de 490-2 para Palmela).

 A base do que se pede a ambos não é muito diferente. Em nome da posição do seu partido, a autarca do PCP deveria manter-se no activo até se terem passado os anos necessários para pedir a reforma, afinal o seu partido é contra a lei que lhe permite reformar-se mais cedo. O que ninguém achou por bem foi em questionar o autarca do PSD por se reformar antes do limite para a reforma que o seu partido quer meter na lei e impôr a todos os portugueses.

 É curioso que duas notícias tão semelhantes andem tão separadas. Não sei se algum regulamento deontológico para a igualde de tratamento obriga a que se cumpra uma quota de notícias sobre mulheres autarcas, mas se não for isso penso que dois casos em tudo iguais serem tratados de forma tão dispar (desde a visibilidade no site aquando da publicação, ao título da própria notícia) deveriam ser tratados de forma mais igual. Pelo menos por uma questão de justiça intelectual...