Tuesday, March 21, 2017

Um racista é um racista.

O que pode levar alguém a sair do buraco de ano e meio em que andou escondido? Será que vai dar grandes explicações para o sucedido? Por ordem inversa, não e as eleições Holandesas.


Quem me conhece facilmente adivinhará porque motivo me afastei. E de forma igualmente fácil constatará porque agora é possível sentar-me e pôr as ideias em ordem.



O que não é tão imediato será o perceber porque só agora falo das eleições na Holanda. Se tivesse de resumir tudo numa palavra, essa palavra seria preocupação. Não a minha, convém ressalvar, mas a preocupação de todos que a mim se dirigiram a pedir informações sobre as eleições Holandesas. A essa preocupação não será alheio o circo montado na imprensa a respeito do populista local. Não foi só em Portugal, entenda-se, mas a verdade é que de repente me tornei uma espécie de especialista em política Holandesa. Não o sou, mas agradeço a consideração.



Será então essa atenção que me fez sair da toca e necessitar de comunicar o que me vai na alma? Não, mas está relacionado. Na verdade foram os comentários de alguém que tem vivido de perto essa política Holandesa, ao ponto de ter dupla nacionalidade e de, pela sua visibilidade, ter sido convidado a exprimir-se sobre a sua posição nessa eleição. Falo do recente vencedor do Prémio SPA para melhor livro de ficção narrativa, Rentes de Carvalho.



Diz o autor, numa publicação no seu blog poucos dias antes das eleições que partilha com Wilders «a sua ideia de deportar os marroquinos que, na Holanda, encabeçam as estatísticas da criminalidade; que a Holanda teria vantagem em se separar da EU (o que não acontecerá); que se deveriam ter fechado as fronteiras (o que está provado  ser impossível ); que os idosos, os pobres e os deficientes não recebem os cuidados a que têm direito; que mesmo um país rico e bem organizado não tem capacidade para absorver a vaga de refugiados – problemática que os sucessivos governos empurram com a barriga no aguardo de milagres.»



Vamos pois enquadrar um pouco. Foram vinte e oito partidos a votos. Sim, 28 em cardinal para não se pensar que se leu mal. De entre esses vinte e oito, o que destaca o Partido Unipessoal (já lá vamos) de Wilders dos restantes é o racismo. Não é a sua posição anti-UE (pelo menos um outro partido era abertamente anti-UE, anti-ONU, anti-tudo-o-que-seja-organização-internacional), não é a sua posição a favor de fechar as fronteiras ou qualquer coisa que represente esse regresso a um passado glorioso (ignorando o lado colonialista desse passado). O que faz Wilders destacar-se, para lá do seu cabelo, é o racismo. Dessa forma, não há outra forma de olhar para um apoiante de Wilders no contexto desta eleição, que não seja a forma de olhar para um racista.



Talvez Rentes de Carvalho não se sinta bem na pele de racista. Convenhamos que não se usa normalmente como elogio, exepto em círculos pouco recomendáveis. Só que bem pode Rentes de Carvalho afirmar que discorda «de Wilders pela irrealidade das suas intenções, pelo seu autoritarismo, pela nada democrática prática de ter um partido em que se pode votar, mas não aceita filiados», porque afinal aquilo em que ele discorda é aquilo que faz Wilders ser Wilders. Votar em Wilders como forma de protesto e dizer que é só como forma de "protesto construtivo" como se não houvessem alternativas de protesto é ou desonestidade inteletual ou vergonha.



Por muito que eu gostasse de acreditar que foi um resquício de vergonha, infelizmente a argumentação que Rentes de Carvalho usa dinamita essa esperança. Como artífice da palavra Rentes de Carvalho alinha na Cruzada em curso contra a islamização. Só assim se entende que ignore que o grupo étnico que lidera as estatísticas para suspeitos de crime serem os cidadãos de meios de etnia Antilhense e só em segundo os marroquinos. Se não acreditam no que digo, não confiem em mim. Vão ao CBS, o equivalente ao INE, e vejam o Relatório Anual sobre Integração. Até poupo o trabalho, é seguir esta ligação e seguir até às páginas 14 e 15 do ficheiro pdf.



Infelizmente estas estatísticas referem-se a suspeitos. Não sei se aqueles marroquinos que lideram as estatísticas de Rentes de Carvalho são os que foram efectivamente considerados culpados ou se são os jovens de segunda geração. No caso dos primeiros seria interessante ter acesso às, chamemos-lhe, estatísticas não sensoriais (na busca por dados oficiais tive de chafurdar em sites vagos e com opiniões não estranhamente semelhantes ao racismo explícito de Wilders e apoiantes); caso sejam os segundos, seria interessante saber para onde se deportam cidadãos de segunda geração. É isso que os racistas ainda não conseguem explicar, mas penso que não será importante, desde que habitem sozinhos a sua bolha de medo.

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