A terminar o comentário ao mês de Julho, seguem umas palavras sobre o mais mal amado de todos os ministros. Falo é claro de Álvaro Santos Pereira, o homem que me fez concordar com uma crónica do Henrique Raposo que não aborda o Benfica.
De certa forma os crimes de Álvaro prendem-se com palavras irrevogavelmente ditas, daí que seja agora uma boa altura para os relembrar, mas não sem antes notar que todos os elogios que se lhe façam nesta altura soarão a epitáfio. Aliás, basta ver como aqueles que indirectamente o trucidaram enquanto ministro e lhe esvaziaram as competências para realizar com sucesso a sua tarefa, se apressaram a elogiar o trabalho desenvolvido. Como sou daqueles que sempre disse que podia até não concordar com as políticas, mas que gostava mais do homem do que de todo o restante executivo, não me sinto a fazer um elogio fúnebre à pessoa. Talvez à política portuguesa, mas essa, como alguns dos seus representantes, já morreu tantas vezes que fica sempre a dúvida se não terá um poucoxinho de zombie.
O primeiro crime de Álvaro terá sido, logo nos primeiros dias, o ter abdicado do título de ministro no tratamento com os seus colaboradores. Num país de engenheiros de domingo e equivalentes doutores, facilmente se percebe o porquê. A sensação clara que fica é que a partir do momento em que Álvaro, membro de um governo que tem como função vincar bem fundo na sociedade portuguesa a existência de duas classes sociais (os que tudo-têm e os que tudo-lhes-falta), arriscou um trato de informalidade, em que abdicou das vénias, abdicou de ser um iluminado para se colocar ao mesmo nível da sua equipa, então Álvaro tornou-se um perigoso revolucionário que teria de ser abatido.
Talvez por isso, qualquer coisa que Álvaro disesse teria de ser alvo de chacota. Veja-se o segundo pecado capital de Álvaro: querer que Portugal criasse uma imagem forte que pudesse vender. Aliás, a ideia de Álvaro é tão inovadora que só quem nunca saiu da sua gruta ou da sua toca não lhe reconhece o valor. Para os que estão nesta situação explico que por entre os três países em que já vivi, e os outros dois ou três que visito regularmente, nunca me faltou ninguém que desconhecesse as tapas ou as paellas espanholas, a moussaka dos gregos, as pastas e as pizzas italianas, os vinhos franceses, as salsichas e as cervejas alemãs, as versões americanas de quase tudo o anterior, enfim, cada país arranjou algo que exportou como a sua imagem, que serve como identidade na altura de criar uma associação entre um produto e o país e que lucra com as pessoas que voam para esses países para experimentarem o "original". Eu, que não percebo nada de marketing, percebi o que ele queria dizer e aplaudo. O coro de críticos que se levantou contra o "pastel do Álvaro" é o equivalente dos que, quando lhes apontam a Lua, comentam o dedo que aponta.
Para lá do que disse, Álvaro também cometeu o pecado de manifestar emoções, em particular boa disposição de espírito. Falo, como se devem recordar, do episódio do Borda de Água. Esse terá sido o momento em que o destino de Álvaro ficou selado. Rir-se de um colega ministro, enxovalhado, como que a validar o enxovalhamento, é crime capital neste governo de gente séria (ou não houvessem ligações várias a contratos lesivos para o Estado e à SLN, passe a redundância).
Álvaro Santos Pereira, mostrou, ao longo dos seus anos, vários crimes capitais de quem está desligado do mercado português. Quiz atacar as rendas estabelecidas, não alinhou no bajulamento indígena, tem uma ideia de como crescer para fora, e não ficar confortavelmente no seu sofá e revelou um traço de humanidade raro em governantes (só isso justifica que o video da risota tenha sido viral). Felizmente agora temos um ministro da Economia que não padece de nenhum dos males e fará vir a nós o Quinto Império. Graças a Deus!
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