Thursday, February 6, 2014

Palavras dos outros: A mortalidade das nações - Viriato Soromenho Marques

Viriato Soromenho Marques, hoje no DN:

Na Antiguidade, o conceito que melhor descrevia a esperança de sobrevivência individual, além da morte física, seria o de "imortalidade". Significando a permanência de nomes e feitos gloriosos no tempo. A imortalidade seria a veneração de uma memória através da perenidade de uma comunidade cultural e política. Ora aquilo que a Europa culta aprendeu com o colapso da Roma antiga é que até os impérios, mesmo os de mil anos, são perecíveis. Hoje, numa Europa à deriva, com a promessa da unidade solidária traída pelo regresso de uma perigosa mistura entre incompetência e pulsão hegemónica, seria conveniente recordarmos que as nações são mortais. Provavelmente, nunca desde as invasões francesas esteve Portugal tão ameaçado como sujeito histórico. Contudo, entre 1807 e 1811, por entre cidades incendiadas e civis fuzilados, a existência de Portugal nunca se encontrou verdadeiramente em causa. 300 mil populares insurrectos tornaram a vida do invasor um inferno. Mesmo se Napoleão tivesse vencido, Portugal ter-se-ia reinventado como potência americana, a partir da corte no Brasil. Hoje estamos entregues a nós mesmos. Sem recuo imperial nem aliados seguros. Mas o maior perigo vem de dentro. De um Governo que bebe alegremente a cicuta num país que vai vendendo os anéis e mutilando os dedos. Uma nação em hemorragia de pessoas e riqueza, onde o Executivo organiza uma espécie de "liquidação total" na festa dos mercados. Deveríamos estar a preparar alternativas nesta hora de emergência existencial. Mas o que se discute na oposição, com azedume e recriminação, são os lugares elegíveis nas listas de deputados para a próxima eleição... Não é temeridade perante o risco. Trata-se, antes, de uma crónica e letal ausência de lucidez.

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